Rap Nacional e Consciência Social: uma leitura crítica da produção lírico-musical do Hip-Hop Brasileiro (1990-2000)

Autores

  • Júnior Cardona Fontoura IFSC Florianópolis
  • Antônio Henrique dos Santos IFSC - Florianópolis(Centro)
  • Dalvani Fernandes

Palavras-chave:

Hip-Hop, Rap Nacional, Periferia, Análise de Conteúdo

Resumo

Hip-Hop e Consciência Social: Uma análise de conteúdo da
Produção Lírico-Musical do Rap Nacional (1990–2000)
Antônio Henrique dos Santos
1 | E-mail antonio.hs@ifsc.edu.br
Júnior Cardona Fontoura
1 | E-mail junior.f2007@ifsc.edu.br
Dalvani Fernandes | dalvani.fernandes@ifsc.edu.br
RESUMO
O Rap Nacional, enquanto manifestação central da cultura Hip-Hop, consolidou-se no Brasil
como uma ferramenta crucial para a denúncia social e a formação da consciência crítica nas
periferias urbanas. Este trabalho, ancorado na Geografia Cultural, investiga as transformações
temáticas e estéticas do gênero entre as décadas de 1990 e 2000, propondo analisá-lo como um
instrumento de representação simbólica dos territórios periféricos. Parte-se da hipótese de que
mudanças socioculturais resultaram numa ressignificação da cultura periférica, refletida
diretamente nas letras do Rap. A pesquisa adota uma abordagem qualitativa e
exploratório-descritiva, utilizando a análise de conteúdo de Laurence Bardin (2016). O corpus é
composto por 20 letras—10 da década de 1990 e 10 da década de 2000—selecionadas com base
em sua relevância na literatura especializada e em métricas de popularidade na plataforma
Spotify. A análise comparativa será guiada por categorias como "Denúncia Social",
"Subjetividade", "Inovação Estética" e "Territorialidade". Os resultados esperados indicam uma
transição significativa. Na década de 1990, com grupos como Racionais MC's, o discurso era
predominantemente combativo, focando na denúncia direta da violência, exclusão e racismo. Já
nos anos 2000, artistas como Emicida mantiveram o compromisso político, mas incorporaram
uma maior diversidade temática, abordando subjetividade, afetos e experimentações sonoras,
sem abandonar as raízes de protesto. Conclui-se que o Rap operou uma ressignificação da
periferia: de território de confronto para espaço de potência criativa, mantendo-se como
narrativa espacial vital para a construção de identidades e a crítica das desigualdades no Brasil.
Palavras-chave: Rap Nacional, Geografia Cultural, Periferia, Análise de Conteúdo.
INTRODUÇÃO
O movimento Hip-Hop é uma expressão cultural formada por diversas
manifestações artísticas, como o Rap — estilo musical apresentado por Djs e MCs em
festas e shows —, o break, uma dança marcada por movimentos acrobáticos, e o grafite,
uma arte visual feita nos espaços urbanos. Considerado pelos próprios praticantes uma
cultura de rua, o Hip-Hop nasceu nos bairros periféricos de Nova Iorque, especialmente
no Bronx, a partir da interação criativa entre o som produzido pelos DJs e a voz dos MCs,
que juntos construíam uma nova forma de expressão musical e social. (CONTIER, 2005)
Compreendendo o impacto do Movimento Hip-Hop na cultura brasileira, o presente
trabalho parte da hipótese de que há mudanças e transformações significativas no
Movimento entre as décadas de 1990 e 2000, as quais podem ser captadas por meio da
análise das letras do Rap Nacional. Busca-se entender as causas dessas mudanças e
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CADERNO DE RESUMOS DA SEMANA NACIONAL DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA - IFSC
analisar suas consequências, observando como um conjunto de transformações
socioculturais e estéticas resultou em uma ressignificação da cultura periférica nesse
intervalo temporal.De acordo com Silva Júnior (2014), observa-se que, a partir da década
de 1990, o Rap Brasileiro consolidou-se como um movimento de forte engajamento
social e político. Grupos como Racionais MC’s e Sabotage trouxeram para suas letras
uma crítica contundente à realidade das periferias, denunciando a violência, a exclusão
e o racismo. Suas composições funcionavam como um espelho das vivências
marginalizadas, conferindo voz a quem era sistematicamente invisibilizado. Já nos anos
2000, o cenário se renovou com o surgimento de uma nova geração de artistas, com
destaque para Emicida. Estes novos rappers mantiveram a potência política do gênero,
mas incorporaram uma maior diversidade temática e estética, abordando a
subjetividade, o amor e novas experimentações sonoras. Dessa forma, sem abandonar
suas raízes de protesto, o Rap Nacional expandiu seus horizontes, dialogando com
questões contemporâneas e alcançando novos públicos e espaços na cena cultural.
2. MÉTODO
A pesquisa adota uma abordagem qualitativa e caráter exploratório-descritivo,
fundamentada na revisão bibliográfica e na análise de conteúdo. A escolha dessa
metodologia se justifica pela natureza discursiva e simbólica do objeto de estudo, que
demanda uma leitura crítica e interpretativa das fontes. Para a análise de conteúdo
utilizaremos o método criado pela professora Laurence Bardin (2016) que estrutura a
análise em três etapas interligadas: pré-análise, exploração do material e tratamento
dos resultados. Como pré-análise identificamos e separamos 10 letras de Rap dos anos
1990, e 10 letras dos anos 2000 que consideramos destaque naquele período. Para isso,
nos baseamos na quantidade de “plays” dados no Spotify e, também, pelos
apontamentos encontrados na literatura específica que encontramos. Para
compreender o funcionamento do Spotify, nos baseamos em Moschetta e Vieira (2025)
que explicam que as playlists são o principal fio condutor da experiência de consumo
neste aplicativo, de forma que a apreciação da música siga um contexto específico, ao
invés de concentrar-se no artista e no álbum, sendo assim, também nos baseamos nas
playlists Rap anos 1990 e Rap anos 2000 que estão disponíveis na plataforma. Criamos
nossa própria playlist. A segunda etapa será a exploração do material, na qual vamos
pensar nas categorizações temáticas e unidades de registro (trechos das letras) para os
Raps do nosso recorte. No tratamento dos resultados faremos a interpretação das
unidades de registro, identificaremos os núcleos de sentido e faremos o contraste entre
os períodos. CATEGORIAS DE ANÁLISE: Denúncia Social e Consciência Coletiva:
Abordagem de violência policial; desigualdade econômica; e racismo. Subjetividade e
Identidade: Expressão de afetos, ancestralidade e autoestima. Inovação Estética e
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Diálogo Cultural: Uso de metáforas, fusão de ritmos e referências intertextuais.
Territorialidade e Política: Representação do espaço periférico como lugar de
resistência e construção identitária.
3. RESULTADOS ESPERADOS
Seguindo o método de Bardin, estrutura-se uma investigação comparativa que
busca compreender como o Rap Nacional, enquanto forma de produção cultural
periférica, contribui para a construção de identidades coletivas e para o fortalecimento
da consciência crítica sobre as desigualdades sociais. A análise das letras deve revelar a
transição de um discurso predominantemente combativo e de denúncia nos anos 1990
para uma produção mais plural, introspectiva e dialogal nos anos 2000, sem perder o
compromisso com a transformação social.
Quadro 01 - Lista de Músicas Selecionadas dos Anos 1990
Músicas Álbum Rapper(s) Quantidade de
Plays (Spotify)
Ano
Tô Só Observando Utopia DJ Jamaika 7.405.879 1998
Verão na V.R A Jogada Final Sistema Negro 2.574.723 1997
Soldado do Morro Traficando
Informação
MV Bill 14.342.998 1999
O Trem RZO RZO 15.510.919 1998
12 de Outubro Versos Sangrentos Facção Central 3.640.156 1999
Diário de um
Detento
Sobrevivendo no
Inferno
Racionais MC’s 117.542.959 1997
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Cachimbo da Paz Quebra-Cabeça Gabriel O
Pensador
74.592.083 1997
Homem na Estrada Raio X do Brasil Racionais MC’s 1993
Sr. Tempo Bom Preste Atenção Thaíde & DJ Hum 6.466.663 1996
Periferia Segue
Sangrando
Os Cães Ladram Mas
a Caravana Não Pára
GOG 881.216 1996
Fonte: Autores, 2025.
Quadro 02 - Lista de Músicas Selecionadas dos Anos 2000
Músicas Álbum Rapper(s) Quantidade de
Plays (Spotify)*
Ano
Rap é Compromisso Rap é Compromisso Sabotage 76.639.211 2000
Só Deus Pode Me
Julgar
Declaração de
Guerra
MV Bill 4.981.150 2001
Vida Loka pt 1 Nada Como Um Dia
Após o Outro Dia
Racionais MC’s 247.767.442 2002
Amor e Ódio A Noiva do Thock Dina Di Citada na literatura 2003
Como Eu Te Quero Babylon By Gus Vol.
1 - o Ano do Macaco
Black Alien 33.163.409 2004
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Periferia Guerreiro, Guerreira Helião, Negra Li 5.377.208 2005
Quando o Pai se Vai Aviso às Gerações GOG 2.624.760 2006
Prá Cima Apenas Thaíde 1.624.760 2007
Desabafo / Deixa Eu
Dizer
A Arte do Barulho Marcelo D2 151.232.666 2008
Triunfo Pra Quem Já Mordeu
Cachorro Por
Comida Até Que Eu
Cheguei Longe
Emicida 9.625.743 2009
Fonte: Autores, 2025.
Com esse trabalho esperamos contribuir para uma leitura geográfica e cultural
do rap como expressão territorial e política, evidenciada pela ênfase na periferia como
território existencial e político nos anos 1990, e sua ressignificação como espaço de
potência criativa nos anos 2000. Identificação das transformações temáticas e estéticas
do rap nacional entre 1990 e 2000, com transição de um discurso de confronto direto
(ex.: Racionais MC's) para narrativas que incorporam ironia, subjetividade e diálogo com
outras tradições culturais (ex.: Emicida). Contribuição teórica ao campo da Geografia
Cultural e dos Estudos Culturais ao reconhecer o Rap como narrativa espacial e
instrumento de mediação social, demonstrando como as letras constroem cartografias
afetivas e críticas da cidade. Buscamos pelo fortalecimento da perspectiva do Rap como
recurso educativo e de valorização das vozes periféricas, destacando seu papel na
formação de identidades juvenis e na crítica estrutural às desigualdades, com
continuidade do compromisso transformador entre as gerações. A aplicação do método
de Bardin (2016) permitirá não apenas catalogar mudanças temáticas, mas demonstrar
como o Rap Nacional opera como prática discursiva viva, capaz de articular resistência e
reinvenção cultural ao longo do tempo.
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REFERÊNCIAS
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Tradução de Luís Antero Reto, Augusto Pinheiro.
1. ed. São Paulo: Edições 70, 2016.
CONTIER, Arnaldo Daraya. O rap brasileiro e os Racionais MC's. In: SIMPÓSIO
INTERNACIONAL DO ADOLESCENTE, 1., 2005, São Paulo. Anais eletrônicos... Disponível
em: https://encurtador.com.br/fsvyL. Acesso em: 1 jul. 2025.
MOSCHETTA, Pedro Henrique; VIEIRA, Jorge. Música na era do streaming: curadoria e
descoberta musical no Spotify. Sociologias, Porto Alegre, v. 20, n. 49, p. 276–311,
maio/ago. 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/j/soc/a/5XZxPbPwL7VhPdhdLgbmzfF/
Acesso em: 1 jul. 2025.
SILVA JÚNIOR, José Geraldo da. Quadros do reconhecimento: a comunicação política
do movimento Hip-Hop de Curitiba. Dissertação em Comunicação Social. UFPR: Curitiba,
2014. p.36-49.
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Publicado

2025-11-10

Edição

Seção

FLORIANÓPOLIS